terça-feira, 17 de outubro de 2017

Manobra de recrutamento alveolar

Manobra de recrutamento alveolar

Pós graduanda:Fernanda Nascimento Gomes
Coordenador da pós graduação: Daniel Xavier

A manobra de recrutamento alveolar (MRA) é uma estratégia que vem sendo utilizada na ventilação mecânica (VM) em pacientes com Síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA) para melhorar as trocas gasosas através do recrutamento máximo de unidades alveolares, proporcionando uma ventilação mais homogênea do parênquima pulmonar. Conforme o III Consenso Brasileiro de Ventilação Mecânica as MRA em pacientes com LPA/SDRA possui grau de recomendação B. 

Dois ensaios clínicos randomizados, ambos ventilando pacientes com LPA/SDRA com volume corrente baixo e PEEP elevada, demonstraram que a MRA foi eficaz na melhora da oxigenação, porém de forma momentânea, no qual logo após a realização da manobra houve o retorno aos valores basais. Por outro lado, outros dois estudos utilizando recursos para aumentar a estabilidade alveolar (posição prona ou elevação da PEEP de acordo com a titulação em manobra decremental), os efeitos do recrutamento puderam ser mantidos.

Titulação da PEEP ideal após manobra de recrutamento

De acordo com o III Consenso Brasileiro de Ventilação Mecânica, possui grau de recomendação D, pois não existe qualquer estudo que demonstre que a utilização da PEEP mais elevada após a manobra de recrutamento alveolar tenha influência isolada no aumento da sobrevida nessa síndrome.

Descrição da Técnica

A manobra de recrutamento máxima deve ser realizada em modo PCV, com driving pressure (pressão de distensão) de 15cmH2O. Iniciar com PEEP=10cmH2O, aumentando o valor da PEEP em incrementos de 5cmH2O a cada 2 minutos, até atingir um valor de 25cmH2O, após o qual aumenta-se o incremento para 10 cmH2O, atingindo 35 e, no máximo, 45cmH2O. Na sequência, baixar a PEEP para 25cmH2O e iniciar de manobra de titulação decremental da PEEP.

Para iniciar a manobra de titulação decremental da PEEP, mudar a ventilação para modo VCV, ajustar volume corrente para 5 mL/kg, fluxo = 60 L/min, onda de fluxo quadrada, ajustar pausa inspiratória entre 0,5 e 1s, manter frequência respiratória = 12-14/min e FiO2 = 1.

Iniciar com PEEP = 25 cmH2O, com decrementos de 2 cmH2O, mantendo por aproximadamente 10 ciclos, calcular o valor da complacência estática do sistema respiratório para cada valor de PEEP, diminuir progressivamente a PEEP até um valor em que a complacência comece a diminuir de forma evidente, identificar a PEEP em que a complacência alcançou o seu valor máximo, e a PEEP considerada “ideal” será encontrada somando-se 2-3 cmH2O ao valor da PEEP que determinou a complacência máxima, logo após, realizar novamente o recrutamento e retornar ao valor de PEEP considerado ótimo.

Open Lung versus ARDSnet 

Apesar da evolução significativa da VM nos últimos anos, a mortalidade em pacientes com SDRA continua elevada. Na tentativa de minimizar os prejuízos causados por esta síndrome, são propostas algumas estratégias de proteção pulmonar. As duas estratégias mais conhecidas para este grupo de pacientes são a Open Lung Aproach (OLA) e a Acute Respiratory Distress Syndrome Network (ARDSnet).

A OLA foi proposta por um grupo Brasileiro do Hospital das Clínicas, que teve sua primeira publicação em 1998, na qual sua estratégia era ventilar os pacientes com 6 ml/kg contra um grupo controle com 12 ml/kg. A estratégia ventilatória preconizava a utilização da ventilação a pressão controlada, com Pplatô < 30 cmH2O, se a PEEP for > 15 cmH2O a Pplatô pode chegar a = ou < 40 cmH2O, manter um drive pressure < 15, hipercapnia permissiva, e buscava melhor oxigenação através da utilização do recrutamento alveolar e cálculo da peep ideal para abertura das áreas colapsadas. O estudo mostrou importantes resultados na mortalidade de pacientes com SDRA. 

Em 2000, a ARDSnet que é uma estratégia de ventilação proposta por um grupo americano, surgiu com uma publicação sobre uma estratégia utilizando volume corrente de 6ml/kg podendo reduzir até 3ml/kg para controle da Pplatô < 30 cmH2O, era presente a hipercapnia e hipoxemia permissiva com SpO2 = ou > 88% e PaO2 = ou > 55mmHg utilizando a PEEP-table (Tabela 1). Nesta estratégia era utilizada o principio baby lung (pulmão funcional, porém anatomicamente pequeno), e não utilizava de manobras de recrutamento alveolar. O estudo precisou ser interrompido, pois o grupo intervenção tinha demonstrado bons resultados e o grupo controle uma alta mortalidade. Assim com este estudo multicêntrico ficou claro que o importante era o controle do volume corrente e Pplatô.

 Após os resultados mostrados, as duas estratégias foram contestadas, na qual relatavam que o recrutamento poderia levar a lesões pulmonares e instabilidade hemodinâmica, e o uso da PEEP-table poderia hiperdistender os alvéolos e propagar lesões por abertura e fechamento cíclico dos alvéolos.
Um estudo em 2016 demonstrou não existir diferenças entre a estratégia que não usa de recrutamento alveolar comparado a que utiliza, mas observou que a driving pressure parece ter um importante desfecho nos pacientes com SDRA, onde quando maior que 15 cmH20 parece demonstrar uma maior mortalidade.

Um recente estudo (2017) abriu um questionamento se agora seria o fim da estratégia da OLA em utilizar a manobra de recrutamento com titulação da PEEP em pacientes com SDRA moderada a grave. Este estudo demonstrou através da análise de 4 grandes ensaios randomizados que a estratégia do OLA apesar de melhorar a oxigenação arterial e diminuir a drive pressure, a aplicação de altos níveis da PEEP, parece piorar os resultados do paciente incluindo a mortalidade, onde um dos estudos revelou maior mortalidade de 28 dias, de 6 meses, além de maior taxa de barotrauma e menor dias livres da VM.

Desta forma, o estudo afirma que os efeitos prejudiciais da OLA excederam os efeitos benéficos, e sugere que a OLA deve ser esquecida para que a comunidade de pesquisa possa passar para outras estratégias potencialmente mais efetivas. E também sugere que os futuros estudos reduzam o volume corrente abaixo de 6ml/kg, evitando assim lesões pulmonares, e que permitam que parte do pulmão fechado com atelectasias permissivas possa ser mais protetor do paciente do que esforços agressivos para manter o pulmão aberto.


Referências bibliográficas

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